O Amor,
"Havia uma cidade em espanto linear a cavalo noutra cidade em geometria ambígua, um jardim era metade do outro, em que as pétalas andavam para trás e para diante, com o perfume trocado e o silêncio das cores tremendo no seu erro cheio de alvoroço florido, os arquitectos disseram: é preciso um novo espaço para estas duas pessoas que estão a pensar tanto com o corpo – e numa casa abria-se a porta que vigiava os corredores onde o pólen se acendia e dançava, e de repente a porta descerrava o espectáculo antigo do nascimento da lua num quarto escuro, via-se o que a lua sempre fez para trepar do soalho para o tecto pelas paredes docemente retardadas, era o tempo da seda entre os nossos vinte dedos embrulhados, e alguém escrevia à máquina num dos planos de intersecção urbana, e a frase escrita aparecia com o seu rumor externo noutro sítio, mas agora via-se no meio de uma clareira de silêncio vivo, e ia-se apreendendo a nossa mútua nudez colocada no sentido da frase, nós éramos essa cidade tremendamente posta em uso, em toda a parte estavam mãos em vez de garfos e lâmpadas, e a frase era assim: o amor, as mãos ininterruptas."
Herberto Hélder
4 comentários:
Guidó: A propósito do comentário que fizeste num post do João Serra, gostava de te dizer que um dos bons fotógrafos que conheço na Madeira (Funchal) se chama Rui Camacho. Será da família dos Camachos's que referes?
Além de fotografo também é músico e faz parte do grupo musical Xarabanda.
Que Maravilha.
beijos
della
O amor, encontrado nas palavras do Poeta...
...é preciso um novo espaço para estas duas pessoas que estão a pensar tanto com o corpo...
João Ramos Franco
as mãos
[interrompidas]
a nudez
[rompida]
o amor
[corrupto]
prometido.
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